quarta-feira, 17 de setembro de 2014

BRASIL: VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA, ATÉ QUANDO?



De Douglas Belchior

A vivência e a troca de experiências que a luta social nos proporciona é extremamente enriquecedora.

Há debates e aprofundamentos em determinados temas que estão muito além de livros e de frias salas de aula.

E há textos que doem.

O debate sobre violência obstétrica é um dessas temas. Corriqueiro, presente, naturalizado. E que precisa ser questionado e combatido com muita radicalidade. Bem como denuncia a Professora Vanessa Gravino.

Leiam e sintam.



Por Vanessa Gravino

A construção de uma sociedade mais justa e igualitária, também passa pelo direito de parir e nascer com dignidade, sem que o parto seja uma ameaça à vida das mulheres e das crianças. Hoje, no Brasil, uma a cada quatro mulheres sofre ou sofreu algum tipo de violência durante o parto. 

Além disso, 90% das mortes de mulheres grávidas poderiam ser evitadas se elas recebessem atendimento adequado. No entanto, quando tocamos nesta questão, esbarramos em pontos relevantes: a mercantilização da saúde e o preconceito racial, destacando que as mulheres que mais sofrem ou morrem por decorrência da gravidez são mulheres negras.

No que se refere à mercantilização da saúde, segundo dados do Ministério da Saúde, mais de 50% dos partos realizados no Brasil atualmente são cesáreas. Se tratarmos apenas das redes particulares este número sobe para, aproximadamente, 83%. A cesárea é uma cirurgia, deve ser utilizada apenas em casos extremos, para salvar vidas, não pode ser regra. No entanto, é muito comum, médicos e médicas orientarem a realizar cesárea colocando-a como “mais segura” que o parto normal. 

Esta orientação não é acaso. Um parto normal pode demorar horas, já a cesárea é realizada em pouco mais de uma hora. 

Algumas delas são feitas quando a mulher entra em trabalho de parto, mas os médicos não querem esperar e forçam psicologicamente a mulher para que aceite a cirurgia da cesárea, com argumentos sem qualquer embasamento científico. 

A mulher, refém daquela situação, aceita tal cirurgia. 

Outras ainda são agendadas antes mesmo da mulher estar em trabalho de parto, o que é ainda pior, pois o bebê nem “amadureceu” dentro da mulher para ser arrancado do útero. Esses profissionais (se é que podemos chamá-los assim) ganham muito dinheiro em pouco tempo de trabalho. 

Não importa aqui se a vida das mulheres e dos bebês está colocada em risco, pois enxergam a saúde como mercadoria. 

Infelizmente esse quadro de violência obstétrica é rotina nos hospitais privados.

A pressão pela realização da cesárea sem necessidade, a violência psicológica que humilha mulheres, principalmente mulheres negras, numa situação de vulnerabilidade é o que chamamos de violência obstétrica. Nos hospitais públicos também há muita violência obstétrica apesar do índice de cesárea ser menor. 

Acontece que no sistema público há inúmeras intervenções desnecessárias ao longo do trabalho de parto. 

Dentre elas estão a episiotomia (corte entre a vagina e o ânus para facilitar a saída do bebê), falta de analgesia (caso a mulher solicite), pressão sobre a barriga para empurrar o bebê (manobra de Kristeller), lavagem intestinal, retirada de pelos pubianos, exames de toque frequentes para verificar dilatação, deixar a mulher deitada durante horas em posições desconfortáveis esperando o parto, o “pedido” para se calar quando as mulheres gritam e até ameaças à mulher e à criança.


As mulheres negras sofrem consequências ainda maiores. 

O preconceito racial no Brasil faz com que a violência obstétrica, em relação a essas mulheres, carregue as marcas do Brasil escravocrata. 

Elas escutam frases e comentários racistas e humilhantes na hora do nascimento de seus filhos e filhas. 

É comum os hospitais do SUS deixarem mulheres negras esperando mais tempo, por acreditarem que “as negras são mais resistentes à dor”, ou ainda, porque o momento do parto é o momento de pagarem pelo “ato” cometido, ou seja, “na hora de transar foi bom, agora aguenta”.


A luta feminista, negra e de direitos humanos deve passar – também – pela busca de um parto humanizado para as mulheres negras e trabalhadoras. 

Um parto que respeite sua fisiologia e sua autonomia. 

Onde as mulheres possam de fato ter informações verdadeiras sobre as formas de nascer, para que suas escolhas estejam pautadas não pela mercantilização da saúde, mas por evidências científicas.

Por mais casas de parto!

Por mais equipes humanizadas em maternidades!

Por apoio aos profissionais humanizados que estão no mercado de trabalho!

Infelizmente esta ainda não é uma realidade em nosso país. Mas, é um tema que devemos abordar com extrema urgência no interior dos debates de violência contra as mulheres e de extermínio da população negra.

Fonte: Carta Capital

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