terça-feira, 25 de agosto de 2015

BRASIL: CRISE HÍDRICA EM SP: A FALÁCIA DO TUCANATO


Apesar das chuvas em 2015 terem sido maiores do que no ano passado, temos menos água hoje para abastecer a Grande SP do que há um ano.

No dia 18 de agosto o Departamento de Água e Energia Elétrica de SP publicou a portaria 2.617 decretando a “criticidade hídrica” do sistema Alto Tietê que abastece a região metropolitana e alguns bairros da capital, principalmente da zona leste. Criticidade é a qualidade do que é crítico, ou seja, usaram um eufemismo, um expressão suave e desconhecida do linguajar, para definir uma situação que é crítica há mais de um ano. Por isso, a expressão falácia, que trata da qualidade do que é falaz resume muito bem a estratégia do tucanato paulista, para um problema que envolve 20 milhões de pessoas – falaz é o enganador, ardiloso, ilusório, enganoso.

No ano passado a seca não poderia ter sido prevista, segundo as notas dissimuladas transmitidas pela SABESP ao longo do período, porque era o maior evento em 84 anos. No final de julho, a SABESP pediu autorização para aumentar a captação do sistema Cantareira de 13,5 mil litros por segundo para 14 mil litros por segundo, além disso, pedia ao DAEE e a Agência Nacional de Águas que desconsiderassem a redução da captação do Cantareira de 10 mil litros por segundo prevista para iniciar em setembro. Porém, no final de junho o governador Geraldo Alckmin ligava as bombas da transferência da água do rio Guaió, que era uma obra “essencial”. Algo, que pouco mais de 30 dias após se comprovou ser uma total estupidez – qualidade de ser estúpido, aquele que tem falta de inteligência, discernimento. Isso deve ser atribuído à população da Grande São Paulo. Trecho de uma notícia do G1, de 11 de agosto:

“- Obra do rio Guaió, inaugurada no final de junho, com 9 km de adutoras para levar 1 metro cúbico por segundo para o Ribeirão dos Moraes, afluente do Taiaçupeba Mirim, depois para a represa Taiaçupeba. As obras vão beneficiar 300 mil pessoas, moradores de Ferraz de Vasconcelos, Itaquaquecetuba, Poá, Suzano, e uma parte da zona leste da capital. Em janeiro de 2015 tinha sido entregue a ampliação da transferência da água do córrego Guaratuba para o Alto Tietê – de 500 litros por segundo para 1.000 litros por segundo.”

Valores de captação dos rios não condizem com a realidade

O engenheiro e sanitarista José Roberto Kachel dos Santos trabalhou 34 anos na SABESP, é um dos integrantes do subcomitê da Bacia do Alto Tietê. Diz ele:

“- Os valores de captação de água anunciadas não condizem com a realidade dos rios. O rio Guaratuba não tem a vazão constante de 1 metro cúbico (equivalente a 1 mil litros) e o rio Guaió não dá mais do que 0,2 metros cúbicos por segundo – portanto 200 litros.”

A declaração foi anterior ao seu depoimento na audiência pública realizada pelo Ministério Público estadual e federal, mais as promotorias do Trabalho e de Contas, além da Defensoria Pública, que reuniu 300 pessoas nos dias 20 e 21 de agosto. Kachel, um dos palestrantes, disse que desde 1948 se sabe que não dava para se retirar mais do que 500 litros por segundo dos rios citados. Ainda emendou:

“- Não sei se o governador está sendo mal assessorado, se está entendendo errado. Esse tipo de obra que você tira água quando tem, para mim é algo totalmente novo”.

Mas o mais importante: “a SABESP colocou o sistema Alto Tietê em risco, porque passaram a retirar 15 mil litros por segundo, quando o autorizado é 12 mil. Quem autorizou isso ninguém sabe, porque não houve discussão no comitê de bacia da região”, disse Kachel dos Santos aos promotores, procuradores e líderes comunitários, prefeitos, vereadores e integrantes dos movimentos sociais, presentes na audiência pública.

Contratos da SABESP sob investigação

Para seguir na linha da estratégia do tucanato. Mais uma vez aumentaram a captação do Cantareira, para cobrir os reservatórios do Alto Tietê, que já baixaram para 17%, enquanto mais uma obra “essencial” não fica pronta – a transferência da água de um braço da represa Billings – 4 mil litros por segundo – para o Alto Tietê, a um custo de R$130 milhões. Aqui é mais propício usar o substantivo avaro, aquele que tem avareza, ou sórdido, excessivamente apegado ao dinheiro. Pois os promotores do Tribunal de Contas anunciaram durante a audiência pública, que estão investigando os contratos da SABESP no valor de R$200 milhões, realizados sobre as condições emergenciais, porém, sem concorrência pública – claro, envolvia o abastecimento de 20 milhões de pessoas, argumentou a empresa.

Aí é que está o detalhe. O decreto de “criticidade” foi publicado no Diário Oficial no dia 18, dando poderes para o DAEE tomar atitudes especiais, mas eles já sabiam que os promotores estavam investigando os contratos. Sem o decreto de emergência não é possível legalmente fazer obra sem concorrência. Outra tática: contratos abaixo de R$4 milhões, o que não obriga o governo estadual a prestar contas ao TCE. E se picotaram as obras justamente para encobrir a falta da emergência? O promotor do TCE, Thiago Lima disse na audiência que eles desconfiam de contratos em valores de mais R$200 milhões, que também não se enquadravam no “emergencial”, cuja portaria saiu um ano e oito meses depois.

Chegamos ao limite com as atuais medidas

Nesta estratégia do tucanato para encobrir uma crise que não existe, porque a “seca não se repetirá”, porque atravessaremos o período seco sem precisar de plano de contingência,” como tem declarado o governador Geraldo Alckmin nos últimos dias, e não há racionamento, apenas restrição no abastecimento, usaremos o verbo dissimular, que significa ocultar ou encobrir com astúcia. Um trecho do artigo de Maru Whately, uma das lideranças da Aliança Pela Água, publicado na Folha de São Paulo – 07.08:

“- Apesar das chuvas em 2015 terem sido maiores do que no ano passado, temos menos água hoje para abastecer a Grande SP, Campinas e Piracicaba do que há 12 meses e muito menos do que em 2013. O Sistema Cantareira opera no volume morto há um ano. Chegamos ao limite da redução do consumo com as medidas adotadas até aqui – transferência entre represas, redução de pressão, bônus e sobretaxa. Sem esse adicional de água, seja da Billings ou do Cantareira será difícil evitar o racionamento em algumas regiões. Uma combinação de evento climático extremo, com problemas históricos de gestão, agravados pela péssima situação de nossos rios e represas. Aprendemos que a falta de transparência e de participação contribuiu para agravar o problema”.

Cantareira em novembro na segunda cota do volume morto

O próprio DAEE na argumentação usada para aumentar a captação do Cantareira diz que até novembro o sistema poderá registrar uma capacidade abaixo de 7%, menor que os 8,8% de novembro de 2014 e vai colocá-lo novamente na cota do segundo volume morto. A situação é muito mais complicada: com ou sem a ligação com a Billings, a SABESP terá que reduzir a captação do Cantareira até novembro em 26%. Em outubro vence a outorga concedida em 2004, pela Agência Nacional de Águas, na época, casualmente, os diretores eram Benedito Braga – atual Secretário de Recursos Hídricos – e Jerson Kelman, atual presidente da SABESP.

Porém, na audiência pública, o presidente da ANA, Vicente Andreu, vai exigir que sejam adotadas medidas restritivas na captação, conforme a situação dos reservatórios, assunto que será tratado em audiências públicas. Sem contar, que qualificou as medidas do governo Alckmin de “bastante ineficientes” e que tiveram motivação eleitoral em 2014. Não adotaram as restrições, inclusive o racionamento declarado para não atrapalhar o pleito.

51 mil litros de esgoto jogados por segundo

Dentro da expressão estupidez podemos incluir ainda outros fatores. O tucanato paulista raciocina como os republicanos dos Estados Unidos. Eles não acreditam em mudança climática e aquecimento global. A obra prioritária para resolver a crise hídrica, que ficará pronta em 2017, é a transferência de água de um afluente do Paraíba do Sul, que até agora já mostra a situação crônica – com capacidade de 8% na vazão, e que abastece todo o estado do Rio de Janeiro. Serão mais R$830 milhões. O professor de engenharia da USP, Ivanildo Hespanhol também foi um dos palestrantes na audiência pública realizadas por promotores e procuradores. Ele qualifica a estratégia do tucanato de transferir água de longe para abastecer os reservatórios como “romana”, em referência aos aquedutos do Império Romano. Diz ele:

“- A única forma de garantir a segurança hídrica da região metropolitana é investir no reuso da água. A SABESP tem uma capacidade instalada de tratar 18 mil litros por segundo, mas trata 16 mil. A Região Metropolitana produz 67 mil litros por segundo, cuja maior parte vai parar nos riachos e córregos e depois nos rios Tietê e Pinheiros”.

Exatamente 51 mil litros de esgoto por segundo distribuídos no sistema hídrico da região metropolitana, e que depois de alguma forma vão parar nas torneiras dos consumidores. Mais: o sistema Cantareira tem 24% de mata nativa na região, e as matas ciliares que deveriam proteger os reservatórios não existem, no lugar delas existem pastagens, lavouras ou eucalipto. O Planeta está sendo assolado por ondas de calor este ano já registradas na Ásia, na Europa e na América do Sul. Mesmo no inverno – em pleno agosto – foram registradas temperaturas acima de 30 graus no Rio Grande do Sul e na Argentina por vários dias seguidos. A seca no cerrado agora está se intensificando. A “criticidade” do tucanato é a falácia do amanhã. É como diz a definição do Aurélio para mentiroso: que não é o que parece ser - enganoso.


Fonte: Carta Maior

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